Na edição de hoje do Portugal Diário, destaque para dois artigos, ambos interessantes e ambos da autoria do jornalista Miguel Marujo e que passo a reproduzir.
"Reutilização do trabalho de profissionais da informação carece de autorização prévia"
Jornalistas também são autores
A demissão de dois ministros do Governo e as convulsões na Justiça portuguesa têm trazido também para primeiro plano a comunicação social. Entre "exclusivos" e "investigações" em primeira mão assiste-se a notícias e reportagens repetidas ou imitadas em diferentes órgãos de comunicação social.
Como pano de fundo: os direitos de autor destes profissionais, as condições precárias em que laboram e a concentração em poucas empresas do sector. Por estes dias, o Sindicato de Jornalistas (SJ) apresentou publicamente as suas preocupações sobre o processo de fusão das empresas do grupo da PT/Lusomundo - que inclui as editoras do Jornal de Notícias, Diário de Notícias, 24 Horas, Tal & Qual e Grande Reportagem, entre outros títulos -, salientando que este "não pode afectar os direitos dos jornalistas, como o vínculo contratual, a antiguidade e a autonomia técnica da profissão".
Por outro lado, em Agosto de 2002, o núcleo sindical de jornalistas "online" do SJ elegia - entre vários aspectos sobre a credibilidade dos "media" electrónicos - a necessidade de reflectir sobre cláusulas de consciência para os jornalistas, o uso indiscriminado de artigos em diversas publicações da mesma empresa e os atropelos aos direitos laborais e de autor. Para o SJ, "qualquer reutilização do trabalho dos profissionais de Informação carece sempre de autorização prévia, caso a caso".
Isto vale para peças preparadas para um órgão que depois aparece "reproduzida" num outro título da mesma empresa. E quando essa "reutilização" é abusivamente feita por profissionais de outros jornais e sem qualquer citação dos trabalhos originais, como por vezes se acusam mutuamente títulos e jornalistas [ver texto "Jornais agressivos "pisam" ética"]?
Para Oscar Mascarenhas, presidente do Conselho Deontológico do SJ, esta atitude é "eticamente inqualificável". "Agora, nunca se atribui a investigação a outro órgão", sobretudo se é um concorrente "directo", diz. E exemplifica com outro caso, em que uma jovem estagiária, perante o reparo da fonte original não identificada, disse ser prática do seu grupo: "Uma vez publicada já se pode publicar sem citar". Não pode, argumenta Mascarenhas.
Para o editor-executivo do Tal & Qual, Luís Nunes, "alguns jornais a citarem-se mutuamente é impossível. O público-alvo de um 24 Horas e de um Correio da Manhã é o mesmo. E, nesse caso, seria admitir que o outro jornal tem boas histórias. Entre os semanários é a mesma coisa", diz. "Eticamente devia-se dizer". Ao órgão sindical chegam poucas queixas, esclarece o dirigente sindical: jornais, rádios e estações de televisão preferem fazer "queixa ou referência" dos eventuais plágios no seu próprio órgão de informação, atacando os que cometeram o abuso. O director do MaisFutebol, Luís Sobral, explica: "Não há tempo para a queixa formal. É tudo tão rápido" nos dias de hoje, que "nem vale a pena". Sobral, que duvida da regulação externa, insiste na tecla do respeito - "que não se ensina e que, infelizmente, muita gente não tem". A editora de Política do Público, Ana Sá Lopes, diz que não vale a pena queixar-se ao Conselho Deontológico do SJ, nem à Alta Autoridade para a Comunicação Social. "São ficções", acusa. "E que se desculpam por não haver queixas".
Outro aspecto, sublinhado por Oscar Mascarenhas, é a precariedade laboral em muitas redacções, que facilitam as pressões de administradores ou superiores editoriais junto de estagiários ou outros profissionais de informação. A solução, em casos destes, passa por "punir o orientador do estágio" ou "o administrador" que intervenha em competências editoriais - como o do director, também presidente de um clube de futebol de uma cidade, que impôs nas suas rádios locais um texto por si escrito a denegrir a oposição na sua agremiação desportiva.
Mas não são razões de precariedade que explicam estes casos, defende Ana Sá Lopes: "Tem a ver com seriedade e é tão possível acontecer com estagiários, como com os outros".
Como pano de fundo: os direitos de autor destes profissionais, as condições precárias em que laboram e a concentração em poucas empresas do sector. Por estes dias, o Sindicato de Jornalistas (SJ) apresentou publicamente as suas preocupações sobre o processo de fusão das empresas do grupo da PT/Lusomundo - que inclui as editoras do Jornal de Notícias, Diário de Notícias, 24 Horas, Tal & Qual e Grande Reportagem, entre outros títulos -, salientando que este "não pode afectar os direitos dos jornalistas, como o vínculo contratual, a antiguidade e a autonomia técnica da profissão".
Por outro lado, em Agosto de 2002, o núcleo sindical de jornalistas "online" do SJ elegia - entre vários aspectos sobre a credibilidade dos "media" electrónicos - a necessidade de reflectir sobre cláusulas de consciência para os jornalistas, o uso indiscriminado de artigos em diversas publicações da mesma empresa e os atropelos aos direitos laborais e de autor. Para o SJ, "qualquer reutilização do trabalho dos profissionais de Informação carece sempre de autorização prévia, caso a caso".
Isto vale para peças preparadas para um órgão que depois aparece "reproduzida" num outro título da mesma empresa. E quando essa "reutilização" é abusivamente feita por profissionais de outros jornais e sem qualquer citação dos trabalhos originais, como por vezes se acusam mutuamente títulos e jornalistas [ver texto "Jornais agressivos "pisam" ética"]?
Para Oscar Mascarenhas, presidente do Conselho Deontológico do SJ, esta atitude é "eticamente inqualificável". "Agora, nunca se atribui a investigação a outro órgão", sobretudo se é um concorrente "directo", diz. E exemplifica com outro caso, em que uma jovem estagiária, perante o reparo da fonte original não identificada, disse ser prática do seu grupo: "Uma vez publicada já se pode publicar sem citar". Não pode, argumenta Mascarenhas.
Para o editor-executivo do Tal & Qual, Luís Nunes, "alguns jornais a citarem-se mutuamente é impossível. O público-alvo de um 24 Horas e de um Correio da Manhã é o mesmo. E, nesse caso, seria admitir que o outro jornal tem boas histórias. Entre os semanários é a mesma coisa", diz. "Eticamente devia-se dizer". Ao órgão sindical chegam poucas queixas, esclarece o dirigente sindical: jornais, rádios e estações de televisão preferem fazer "queixa ou referência" dos eventuais plágios no seu próprio órgão de informação, atacando os que cometeram o abuso. O director do MaisFutebol, Luís Sobral, explica: "Não há tempo para a queixa formal. É tudo tão rápido" nos dias de hoje, que "nem vale a pena". Sobral, que duvida da regulação externa, insiste na tecla do respeito - "que não se ensina e que, infelizmente, muita gente não tem". A editora de Política do Público, Ana Sá Lopes, diz que não vale a pena queixar-se ao Conselho Deontológico do SJ, nem à Alta Autoridade para a Comunicação Social. "São ficções", acusa. "E que se desculpam por não haver queixas".
Outro aspecto, sublinhado por Oscar Mascarenhas, é a precariedade laboral em muitas redacções, que facilitam as pressões de administradores ou superiores editoriais junto de estagiários ou outros profissionais de informação. A solução, em casos destes, passa por "punir o orientador do estágio" ou "o administrador" que intervenha em competências editoriais - como o do director, também presidente de um clube de futebol de uma cidade, que impôs nas suas rádios locais um texto por si escrito a denegrir a oposição na sua agremiação desportiva.
Mas não são razões de precariedade que explicam estes casos, defende Ana Sá Lopes: "Tem a ver com seriedade e é tão possível acontecer com estagiários, como com os outros".
"Mercado cada vez mais agressivo" ajuda ao atropelo de regras. "Tendência é para piorar"
Jornais agressivos "pisam" ética
Um "mercado cada vez mais agressivo" na comunicação social tem ajudado ao atropelo diário das regras do jogo. O lamento é geral, constatou o PortugalDiário, depois de ouvidos editores de diferentes jornais. "E a tendência é para piorar", antecipa Luís Nunes, editor-executivo do Tal & Qual.
Os casos sucedem-se: há dias, quando da notícia do favorecimento de um ministro à filha de outro ministro, a SIC e a TVI apresentavam uma investigação "exclusiva". Que era a mesma, só que com dados diferentes e complementares. Na sexta-feira passada, O Jogo mostrou em "exclusivo" as fotografias de uma brincadeira de jogadores do Benfica, que vinham publicadas na generalidade da imprensa.
Também na sexta-feira, O Independente publicou uma fotografia do procurador João Guerra, responsável da investigação à Casa Pia, que o 24 Horas diz ser sua. Pedro Tadeu, director deste diário, relatou ao PortugalDiário que o semanário lhes solicitou a fotografia e que - perante a recusa do fotógrafo e do jornal na sua cedência - digitalizaram a imagem e manipularam-na, sem qualquer referência à fonte.
E quando são notícias?, quis saber o PortugalDiário. Aqui as leituras divergem: "Todo o trabalho alheio devia ser citado", defende Ana Sá Lopes, editora de Política do Público; "esse comportamento é pouco digno, mas toda a notícia tem um prazo - que, no caso de um diário é de 24 horas -, a partir daí é do domínio público", argumenta Pedro Tadeu. E exemplifica: "O Diário de Notícias, por absurdo, dá um notícia, só deles. Já assegurou o seu exclusivo por 24 horas, o que é fantástico. Os outros jornais, no dia seguinte, não podem ignorar a notícia, tentam-na trabalhar o melhor possível, conseguir novos ângulos" - e publicá-la.
A internet ainda é uma boa fonte de ideias e notícias para a comunicação social "tradicional", diz Luís Sobral, director do jornal desportivo on-line MaisFutebol. O custo dos cartazes de Santana Lopes e o IVA cobrado pelos telefonemas de solidariedade com as vítimas dos incêndios fizeram manchete no PortugalDiário, para - menos de 24 horas depois - estarem noutros diários. Sem citação. "Há quem ache que é uma fonte de informação menor, que não é!", diz Sobral. E tenta explicar: "Quando vão à "net", as pessoas sentem-se à vontade para pegar numa história, por entenderem que não chegou a toda a gente".
A prática do Público é "atribuir a quem deu" uma informação, explica Ana Sá Lopes. Luís Sobral concorda: "O Público é o jornal que está mais próximo daquilo que devia ser a prática dos outros. É um bom modelo". Mas, para a editora daquele diário, "há coisas que causam dúvidas". E acrescenta um dado à discussão - sobre a informação internacional: "Tenho muitas vezes dúvidas sobre os textos irem assinados", diz, lembrando que essa é a prática no seu jornal.
O director do MaisFutebol relata casos em que "notícias internacionais, recolhidas noutras fontes e que são indicadas", aparecem depois "descobertas" por outros. É a lei do menor esforço, argumenta Luís Sobral. "Poupa-se dinheiro nas redacções e aproveita-se o trabalho alheio".
"Picar" uma notícia "mostra falta de criatividade", sublinha Luís Nunes. "Há coisas que são uma tremenda falta de ética", "lê" o editor-executivo do Tal & Qual. Mas reconhece ter dúvidas nalguns aspectos: o seu semanário desenvolve muitas notícias publicadas durante a semana - e "não citamos a origem, mas se calhar devíamos fazê-lo".
Também Pedro Tadeu defende que se deve "caminhar para evitar fontes anónimas". O que inclui sites: "Se a fonte é um site, para credibilizar a informação temos de dizer qual é a fonte", defende o director do 24 Horas. Luís Sobral não pode estar mais de acordo: "Numa altura em que o conteúdo tende a massificar-se, é importante que não seja "sugado" dez minutos depois de estar feito". Afinal, lembra, "toda a gente se inspira em toda a gente, é impossível inventar algo todos os dias, mas a única possibilidade é haver respeito".
Os casos sucedem-se: há dias, quando da notícia do favorecimento de um ministro à filha de outro ministro, a SIC e a TVI apresentavam uma investigação "exclusiva". Que era a mesma, só que com dados diferentes e complementares. Na sexta-feira passada, O Jogo mostrou em "exclusivo" as fotografias de uma brincadeira de jogadores do Benfica, que vinham publicadas na generalidade da imprensa.
Também na sexta-feira, O Independente publicou uma fotografia do procurador João Guerra, responsável da investigação à Casa Pia, que o 24 Horas diz ser sua. Pedro Tadeu, director deste diário, relatou ao PortugalDiário que o semanário lhes solicitou a fotografia e que - perante a recusa do fotógrafo e do jornal na sua cedência - digitalizaram a imagem e manipularam-na, sem qualquer referência à fonte.
E quando são notícias?, quis saber o PortugalDiário. Aqui as leituras divergem: "Todo o trabalho alheio devia ser citado", defende Ana Sá Lopes, editora de Política do Público; "esse comportamento é pouco digno, mas toda a notícia tem um prazo - que, no caso de um diário é de 24 horas -, a partir daí é do domínio público", argumenta Pedro Tadeu. E exemplifica: "O Diário de Notícias, por absurdo, dá um notícia, só deles. Já assegurou o seu exclusivo por 24 horas, o que é fantástico. Os outros jornais, no dia seguinte, não podem ignorar a notícia, tentam-na trabalhar o melhor possível, conseguir novos ângulos" - e publicá-la.
A internet ainda é uma boa fonte de ideias e notícias para a comunicação social "tradicional", diz Luís Sobral, director do jornal desportivo on-line MaisFutebol. O custo dos cartazes de Santana Lopes e o IVA cobrado pelos telefonemas de solidariedade com as vítimas dos incêndios fizeram manchete no PortugalDiário, para - menos de 24 horas depois - estarem noutros diários. Sem citação. "Há quem ache que é uma fonte de informação menor, que não é!", diz Sobral. E tenta explicar: "Quando vão à "net", as pessoas sentem-se à vontade para pegar numa história, por entenderem que não chegou a toda a gente".
A prática do Público é "atribuir a quem deu" uma informação, explica Ana Sá Lopes. Luís Sobral concorda: "O Público é o jornal que está mais próximo daquilo que devia ser a prática dos outros. É um bom modelo". Mas, para a editora daquele diário, "há coisas que causam dúvidas". E acrescenta um dado à discussão - sobre a informação internacional: "Tenho muitas vezes dúvidas sobre os textos irem assinados", diz, lembrando que essa é a prática no seu jornal.
O director do MaisFutebol relata casos em que "notícias internacionais, recolhidas noutras fontes e que são indicadas", aparecem depois "descobertas" por outros. É a lei do menor esforço, argumenta Luís Sobral. "Poupa-se dinheiro nas redacções e aproveita-se o trabalho alheio".
"Picar" uma notícia "mostra falta de criatividade", sublinha Luís Nunes. "Há coisas que são uma tremenda falta de ética", "lê" o editor-executivo do Tal & Qual. Mas reconhece ter dúvidas nalguns aspectos: o seu semanário desenvolve muitas notícias publicadas durante a semana - e "não citamos a origem, mas se calhar devíamos fazê-lo".
Também Pedro Tadeu defende que se deve "caminhar para evitar fontes anónimas". O que inclui sites: "Se a fonte é um site, para credibilizar a informação temos de dizer qual é a fonte", defende o director do 24 Horas. Luís Sobral não pode estar mais de acordo: "Numa altura em que o conteúdo tende a massificar-se, é importante que não seja "sugado" dez minutos depois de estar feito". Afinal, lembra, "toda a gente se inspira em toda a gente, é impossível inventar algo todos os dias, mas a única possibilidade é haver respeito".
E, no meio de tantas falcatruas, trocas e baldrocas, os patrões lá vão enfiando os cobres no bolso. Como se ninguém soubesse que tudo isto acontece a torto e a direito em todas as redacções do país. Afinal, o que interessa é chegar primeiro; os meios que se utilizaram para lá chegar, não interessam para nada.
E este é que é, infelizmente, o jornalismo que se pratica neste rectângulo à beira mar plantado.
Aguardam-se, contudo, outros pontos de vista.
E este é que é, infelizmente, o jornalismo que se pratica neste rectângulo à beira mar plantado.
Aguardam-se, contudo, outros pontos de vista.
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