quinta-feira, janeiro 02, 2003

O papel do jornalista

Um jornalista n�o � um novelista, ainda que devese ter, para contar, o mesmo talento e a mesma gra�a dos melhores romancistas. Uma boa reportagem t�o pouco � um tipo de literatura, ainda que devesse ter a mesma intensidade de linguagem e a mesma capacidade de sedu��o dos grandes textos liter�rios. E, para ir ainda mais longe e ser mais claro do que acredito ter sido, um bom jornal n�o deveria estar cheio de grandes reportagens bem escritas, porque isso condenaria os seus leitores � satura��o.
Mas, se os leitores n�o encontram todos os dias, nos jornais que l�em, uma reportagem, uma �nica reportagem, que os hipnotize tanto como para que cheguem tarde ao seu trabalho, ent�o n�o ter�o por que atirar a culpa � televis�o ou � Internet dos seus eventuais fracassos, se n�o � sua pr�pria falta de f� na intelig�ncia dos seus leitores.

Antes, os jornalistas de alma sonhavam em escrever o romance da sua vida, ainda que fosse apenas um; agora, os novelistas de alma sonham em escrever uma reportagem ou uma cr�nica, t�o inesquec�veis como um belo romance. O problema est� em que os romancistas o fazem e, os jornalistas, ficam-se apenas pela vontade.
Seria preciso incit�-los, portanto, a que realizem essa frustra��o nas p�ginas dos seus pr�prios jornais, contando as hist�rias (ou est�rias) da vida real com assombro e plena entrega do ser, com a obsess�o pelo dado preciso e a paci�ncia de investigadores que caracteriza os melhores novelistas. N�o estou a preconizar que se escrevam novelas nos jornais. Nada disso. E menos ainda que se use a linguagem florida e adjectivada � que recorrem os jornalistas que se improvisam como novelistas da noite para o dia. T�o pouco defendo a ideia de que o mediador de uma not�cia se converta no protagonista. Claro que n�o.
Um jornalista que conhece o seu leitor jamais se exibe.
Estabelece com ele, desde o princ�pio, o que eu chamaria de um pacto de fidelidades: fidelidade � pr�pria consci�ncia e fidelidade � verdade. A avidez de conhecimento do leitor n�o se sacia com o esc�ndalo, mas com a investiga��o honesta; ela n�o � aplacada com golpes de feito, mas com a narra��o de cada facto dentro do seu contexto e dos seus antecedentes. Ao leitor, n�o se oferecem fogos de artif�cio ou den�ncias estrepitosas que se desvanecem no dia seguinte, mas sim, respeita-se com a informa��o precisa. Cada vez que um jornalista atira lenha ao fogo f�tuo do esc�ndalo, est� apagando com cinzas o fogo genu�no da informa��o.
O jornalismo n�o � um circo para se exibir, se n�o um instrumento para pensar, para criar, para ajudar o homem no seu eterno combate por uma vida mais digna e menos injusta.
Tudo isto, para reafrirmar o que anteriormente j� aqui foi dito: o que tende a acabar � o bom jornalismo feito por bons jornalistas...

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